terça-feira, 29 de março de 2011

Calundu

O calundu é um termo, caído em desuso, que até meados do século XVIII era sinônimo de candomblé ou macumba. Também significa mal-humor.
Segundo o Dicionário Aurélio, a palavra "calundu" tem origem angolana e vem da palavra kilundu, que é um ente sobrenatural que dirige os destinos humanos entrando no corpo de uma pessoa, a torna triste, nostálgica, mal-humorada:

"...o tédio, a amargura, os choros sem motivo, os calundus, os chiliques” (Jorge Amado, Teresa Batista Cansada de Guerra, p. 156); “...deu palmada de acalmar calundu nas costas de mana Chica” (Jorge Macedo, Gente de Meu Bairro, p. 89).

Do Calundu ao Candomblé

"Desde o século XVII se tem notícias de cultos africanos em terras brasileiras. De fato, há cerca de vinte anos uma imensa massa de informações sobre o que se convencionou chamar “calundu colonial” começou a ser revelada por historiadores e antropólogos brasileiros, que, investigando nos arquivos públicos e da Santa Inquisição, se depararam não apenas com novos dados mas também com novas interpretações sobre um tema até então mal conhecido.

Os animadores desses misteriosos cultos de origem africana começaram então a ocupar a cena historiográfica. Figuras como o congolês Domingos Umbata, flagrado em 1646 pelos visitadores da Inquisição na capitania de Ilhéus; a angolana Branca, ativa na cidade baiana de Rio Real nos primeiríssimos anos do século XVIII; outra angolana, Luzia Pinta, muito bem sucedida na freguesia de Sabará, nas Minas Gerais, entre 1720 e 1740; a courana Josefa Maria ou Josefa Courá com sua “dança de Tunda”, estabelecida em 1747 no arraial de Paracatu, Minas Gerais; o daomeano Sebastião, estabelecido em 1785 na cidade de Cachoeira, no Recôncavo Baiano; e enfim Joaquim Baptista, ogan (uma espécie de líder de terreiro) do “culto ao deus Vodum”, no Accu de Brotas, freguesia periférica da cidade da Bahia, em 1829.

A esta lista poderia ser acrescentada uma significativa aquarela de Zacharias Wagener, artista que viveu no Pernambuco holandês de 1634 a 1641, representando uma festa de africanos e trazendo preciosas informações visuais sobre a variedade e a disposição dos atores, figurinos e instrumentos musicais.

Os adeptos dos calundus organizavam suas festas públicas na residência de uma pessoa importante da comunidade, ou então em casas também destinadas a outras ocupações. Não tinham templos propriamente ditos, mas também não se tratava de simples cultos domésticos, uma vez que tinham um calendário de festas, iniciavam vários fiéis em diferentes funções e eram freqüentados por um número razoavelmente grande de pessoas, inclusive brancos, vindos de diversos arraiais. Ademais, o sacerdote principal tinha condições de ganhar bem a vida com o atendimento individual e se tornar financeiramente independente ao prestar à população serviços essenciais que o Estado colonial não assegurava satisfatoriamente.

A documentação da época permite identificar três tipos de sacerdócio, às vezes reunidos numa mesma pessoa, como Luzia Pinta, que era “calunduzeira, curandeira e adivinhadeira”. Isso significa que, além de oficiantes religiosos, esses personagens sabiam preparar tisanas, cataplasmas e ungüentos que aliviavam os males corriqueiros dos habitantes da colônia, eram também capazes de curar doenças mais graves como a tuberculose, a varíola e a lepra, usando os recursos da farmacopéia tradicional, participaram inclusive do combate às epidemias que assolaram a Bahia em meados do século XIX; também sabiam curar distúrbios mentais ou espirituais, usando tratamentos combinados e complexos.

Na cidade de Rio Real, no interior baiano, o Santo Ofício identificou o caso de um senhor empresário que pagou caro por pelo menos duas escravas curandeiras afamadas, montando com elas uma espécie de clínica onde se praticavam vários tipos de cura, e dividindo com elas todos os lucros. Desses registros, surgiram notícias de curandeiros e adivinhadores sendo recebidos em monastérios, nos meios ricos, onde eram bem pagos, e até agraciados pelo rei de Portugal por bons serviços prestados. A eficiência dos saberes africanos era pública e notória, mas na prática sua existência questionava o monopólio da cura atribuído à Igreja e mesmo à medicina oficial" (Por: Renato da Silveira).

Fontes: Enciclopédia da Música Brasileira - Art Editora; Dicionário Aurélio; Revista de História da Biblioteca Nacional.

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